Hoje sou feliz!

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Testemunho verídico de Liliana
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“Hoje
quando vejo com tranquilidade pequenos problemas vividos por amigas,
colegas de trabalho, sei que acabo deixando a impressão de frieza, o que
não é verdade, mas a vida por vezes nos cobra um ónus tão grande por
determinadas coisas, que aprendemos só valorizar o que realmente vale a
pena.”
Lembro-me
que ainda criança, próxima da adolescência, eu me sentia estranha, pois
alguma coisa me atraia para as minhas amigas de escola. Sempre tive
mais amigas, até porque naquela época ter amigos homens era quase
proibido, principalmente para as que eram como eu que viviam numa cidade
pequena no interior, do interior do país.
Eu
me sentia atraída por outras raparigas, mas escondia quase que de mim
mesma, nem ousava pensar sobre isto perto de alguém. Lembro-me que
quando criança, ouvia meus pais comentarem sobre determinadas mulheres
que eram “estranhas”, porque gostavam de outras mulheres.
Os
anos foram passando eu descobri através da leitura (sempre gostei muito
de ler), que eu não era a única, era apenas mais uma. E que o que eu
sentia, mesmo não sendo normal aos olhos dos outros, existia.
Namorei
homens, mas nunca me senti confortável com eles, hoje pensando sobre
isso, chego à conclusão que realmente nunca vi neles nada que me
atraísse, acho que até por isso eu namorei poucos homens. Não que eu não
os ache interessantes, bonitos, mas nada mais que isso.
Com
quase vinte anos nos mudamos daquela cidade pequena e cheia de
preconceitos. Viemos para uma grande cidade onde moro até hoje, ai me
senti mais livre, mas mesmo assim desconfortável. Ainda morava com meus
pais e um irmão que é o preconceito personificado.
Os
anos passavam e eu não tinha coragem para ousar, tinha medo de que
descobrissem, mesmo sabendo que meu irmão tinha plena consciência da
minha opção sexual. Isso nos distanciava e me deixava insegura.
Quase
que coagida por aquela pressão velada, namorei um homem com o qual me
casei mesmo sem amor. Absolutamente sem amor. Mas eu me via obrigada a
ter um homem para chamar de meu; mas, eu sempre digo que Deus se
encarrega de nos dar algumas chances na vida para consertarmos
determinadas atitudes erradas que tomamos. Fiquei casada menos de seis
anos, e então meu marido faleceu. Não desejei isso, apenas aconteceu.
Fiquei
viúva com um filho de dois anos e meio. Então fiz um juramento: nunca
mais me casaria, e acredite, cumpro fielmente esta promessa. Sou viúva
há mais de quinze anos.
Com
o prazer de ser livre novamente, criei asas, demorei mas me
reencontrei. Namorei muito, amei demais, tive grandes amores, alguns
desamores, mas pela média ainda estou com um bom lucro. Descobri o
prazer de esperar pela pessoa amada, o prazer da cumplicidade, o prazer
que só sabe o valor, aquelas pessoas que amam.
Hoje
meu filho tem quase dezoito anos, vivemos eu e ele. Há uma pessoa muito
especial na minha vida. Uma pessoa que me preenche sem me sufocar.
Há
pouco mais de oito anos, por estar sem fazer nada na hora do almoço,
resolvi entrar em uma sala de bate papo e conheci uma pessoa que como
eu, estava passeando pelas salas. Houve uma empatia imediata e ficamos
amigas. Ela tinha uma outra pessoa. Como não estávamos ali procurando
ninguém, isso foi irrelevante. E mais, era impensável morar no Brasil e
me interessar por alguém que morava em Luanda. Mas foi mais forte do que
nós, quando nos demos conta estávamos envolvidas e um ano depois do
nosso encontro na sala de bate papo ela veio visitar-me. Estamos juntas
há mais de oito anos. Já fui a Luanda visita-la, e ela vem sempre ao
Brasil, inclusive comprou casas no Nordeste brasileiro. Passamos todas
as férias juntas, no final do ano nos reunimos com famílias, amigos etc.
Nunca
pensamos em morar na mesma casa, até porque não daria certo. Tenho
filho, e ela não. Isso dificulta um pouco e mais, por ser angolana e só
conseguir vistos de no máximo seis meses, tornaria este projeto, se
houvesse, inviável. Nos vemos muito e isso me basta. Gosto do meu
espaço, de por vezes estar só, fazer novos amigos, sentir saudades.
Quando
nos conhecemos eu estava me recuperando do fim de um relacionamento que
tinha sido muito prazeroso, mas acabado. Eu estava em baixa, com
auto-estima a zero e ela foi fundamental no meu processo de recuperação,
de voltar a acreditar que poderia amar de novo, de ser amada, de ter
novamente um relacionamento agradável.
Em
relação a homossexualidade, as coisas nem sempre foram fáceis. Hoje
tudo está muito mais liberado, mas antes, “isso” era como uma maldição.
Hoje a mídia, as novelas, o teatro, ajudam a liberar tudo.
Hoje sinto-me uma mulher feliz pois tenho um filho maravilhoso e uma mulher que me ama e com quem posso partilhar a minha vida.
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